quinta-feira, 22 de setembro de 2016

PS e PSD recuam e admitem discutir dinheiro público para os partidos

Sociais-democratas vão apresentar proposta para tornar definitivos os cortes actuais. Socialistas remetem discussão para a comissão da transparência e primeiro-ministro admite que as despesas com as campanhas eleitorais podem ser reduzidas.

O PS e o PSD deram esta quinta-feira um passo atrás na questão do financiamento público aos partidos políticos, admitindo agora discutir, no âmbito parlamentar, a conversão dos cortes temporários das subvenções políticas em definitivos. O PSD afirma mesmo que vai apresentar uma proposta nesse sentido, tal como já tinham prometido fazer BE, PCP e CDS. Questionado pelo PÚBLICO sobre como votará o PS esta proposta, o líder parlamentar, Carlos César, respondeu que será canalizada para a comissão da transparência.

Ao remeter o assunto para a Comissão Eventual para o Reforço da Transparência dos cargos públicos e políticos, criada em Maio por proposta do PS, os partidos empurram para o próximo ano a entrada em vigor das novas regras. Isso fará com que, a partir de 1 de Janeiro de 2017, a redução decidida em 2010 e confirmada em 2013 deixe de estar em vigor, ainda que temporariamente, e os partidos possam voltar ao valor do financiamento original. Se a reversão fosse definitiva, faria entrar nos cofres do PSD e do PS cerca de 1,3 milhões de euros por ano.

Questionado por Catarina Martins durante o debate quinzenal, António Costa disse que o Governo não introduzirá qualquer medida de alteração ao actual regime no Orçamento do Estado – o que implica a reversão dos cortes a 1 de Janeiro – por não querer “condicionar o debate na Assembleia da República”. Mas se os partidos entenderem prolongar os cortes, “o Governo respeitará”. Realçando que “a democracia tem um custo e não é um peso”, o primeiro-ministro e líder do PS defendeu ainda que o financiamento partidário deve ser público, mas considera “consensual que é possível reduzir o custo das campanhas eleitorais”.

Depois de há poucos dias, em declarações ao PÚBLICO, o secretário-geral do PSD, José Matos Rosa, ter mostrado vontade em acabar com o corte das subvenções aos partidos, o líder da bancada social-democrata, Luís Montenegro, manifestou esta quinta-feira disponibilidade para discutir – com o PS – a transformação do corte transitório em “permanente e definitivo”.

"Se a Assembleia da República e os demais partidos tiverem interesse em transformar este corte que era transitório num corte permanente e definitivo, em primeiro lugar deve fazê-lo, não na lei do Orçamento do Estado, isto é, não deve ser para o ano de 2017, deve ser para todos os anos subsequentes", defendeu Luís Montenegro aos jornalistas no Parlamento.

Ao início da noite, Matos Rosa enviou um comunicado às redacções no qual justifica a mudança de posição: “Os partidos políticos são fundamentais para a democracia, mas devem ser os primeiros a reconhecer a realidade e actuar em função da sociedade em que estão integrados”.

O fim dos cortes às subvenções dos partidos e das campanhas já tinha a oposição do BE, CDS e PCP. “Não terminou a austeridade no país e foi substituída por uma austeridade ‘a la esquerda’”, justificou a líder centrista, recusando comentar as posições que o PSD e o PS tinham sustentado nos últimos dias.

O PCP reafirmou a sua discordância sobre a reposição das subvenções aos partidos em 2017, não só por uma questão de princípio – “o financiamento deve depender dos militantes e não do Estado” –, mas também porque seria uma medida incompreendida. “Obviamente que os portugueses que foram sacrificados e perderam poder de compra não compreenderiam que houvesse reposição dos cortes nas subvenções”, afirmou o deputado António Filipe.
in Público, 22/09/2016 

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Presidente da Câmara de Góis arguida por difamação a um vereador do seu partido

A autarca acusou o seu antigo “número dois” de “falta de lealdade e incompetência” no exercício das funções autárquicas

A presidente da Câmara de Góis, a socialista Lurdes Castanheira, foi constituída arguida num processo por difamação movido por um vereador do seu partido, confirmou nesta quinta-feira a própria à agência Lusa.

O processo remonta a finais de 2014, quando José Rodrigues, eleito na lista do PS, se sentiu ofendido por declarações à imprensa em que a presidente acusou o seu antigo “número dois” de “falta de lealdade e incompetência” no exercício das funções autárquicas.

A presidente da Câmara retirou os pelouros e a confiança política a José Rodrigues, que no anterior mandato (2009-2013) tinha assumido a vice-presidência e que, em Dezembro de 2014, desempenhava funções no executivo a tempo inteiro.

Na sequência da queixa-crime ao Ministério Público, Lurdes Castanheira foi ouvida na 2.ª Secção do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Coimbra, estando o inquérito já concluído.
A arguida foi acusada pela prática do crime de difamação nos autos de um processo, agora em curso no 3.º Juízo da Instância Local Criminal da Comarca de Coimbra, no qual José Rodrigues figura como assistente.

Lurdes Castanheira disse hoje à Lusa que “não tinha intenção de ofender” o vereador, alegando que as suas declarações “infelizmente foram deturpadas” pela comunicação social.

Em Dezembro de 2015, por proposta de José Rodrigues, a Câmara de Góis retirou à presidente as competências que tinha delegado em Lurdes Castanheira no início do mandato.

Na ocasião, em declarações à Lusa, o vereador disse ter tomado tal iniciativa por entender que a presidente “deixou de reunir condições mínimas para continuar à frente dos destinos da autarquia de Góis, após o chumbo por duas vezes do orçamento” e das grandes opções do plano para 2016.

Nos últimos meses, José Rodrigues e os dois vereadores da oposição, Diamantino Garcia e Helena Moniz, eleitos pelo Grupo de Cidadãos Independentes por Góis, têm tomado várias posições em conjunto, acabando por funcionar como maioria num executivo constituído por cinco membros.

Em Julho, Garcia, Moniz e Rodrigues, todos antigos vice-presidentes da Câmara eleitos em listas do PS, abandonaram a reunião da Câmara em desacordo com a presidente sobre alterações ao mapa de pessoal.

Em Agosto, o presidente da mesa da Assembleia Municipal, José António Carvalho, do PS, renunciou ao cargo.

Lurdes Castanheira reafirmou que “continua a ponderar” avançar com uma acção em tribunal com vista à dissolução do executivo.

in Público, 15.09.2016

sábado, 10 de setembro de 2016

Autárquicas: PS receia perder em Coimbra

A um ano das próximas eleições autárquicas, a reconquista das presidências das câmaras municipais de Coimbra e Góis é tida como difícil por parte da direcção do PS.
Segundo o diário Público, o partido elaborou uma lista com os 10 municípios onde acha que haverá elevado grau de dificuldade para repetição de triunfos. Trata-se dos de Coimbra, Góis, Barcelos, Golegã, Matosinhos, Marinha Grande, Nelas, Torres Novas, Vila do Bispo e Vizela.
Deste elenco, assinala o diário, a “grande surpresa” é a Câmara Municipal de Coimbra (CMC), cujo presidente, Manuel Machado, foi eleito para quarto mandato, em 2013, depois de ter cumprido três consecutivos (1990 - 2001).
A jornalista Margarida Gomes alude a quem considere que a “forma apagada como [o autarca] tem gerido o Município” prejudica o PS.
Há três meses, o “Campeão” noticiou a realização de uma sondagem, a cargo da empresa Pitagórica, tendo em vista as eleições autárquicas de 2017, testando a popularidade de Manuel Machado e as de outros três potenciais candidatos do PS à presidência da CMC.
Para aferir as hipóteses de sucesso do actual líder do Município conimbricense, aquela sociedade vocacionada para estudos de mercado propôs o confronto da provável recandidatura dele com as hipotéticas candidaturas de Maria Manuel Leitão Marques (ministra), Duarte Nuno Vieira (director da Faculdade de Medicina da UC) e João Galamba (deputado à Assembleia da República).
A Pitagórica não revelou a pedido de quem efectuou o estudo de opinião.
O segredo não permite fazer luz acerca da autoria da escolha dos nomes das figuras tidas como eventuais alternativas ao autarca, avultando, ainda assim, a particularidade de a ministra da Presidência e da Modernização Administrativa (catedrática da Faculdade de Economia da UC), Duarte Nuno Vieira e João Galamba serem pessoas do círculo de amizades do líder do PS (António Costa).
O Público questionou o líder concelhio do PS/Coimbra, “no sentido de perceber se a recandidatura de Manuel Machado estava garantida”, mas “João Paulo Almeida e Sousa não deu grandes explicações”, limitando-se a referir a inexistência de uma data para anúncio da (re)candidatura.
“Vamos realizar uma Convenção Autárquica, a 05 de Novembro, e ver-se-á se é altura para anunciar a candidatura”, indicou o dirigente partidário, que substituiu Rui Duarte na presidência da Comissão Concelhia de Coimbra do PS.
Quanto ao Município de Góis, a líder camarária, Lurdes Castanheira, enfrenta dificuldades inerentes ao facto de um vereador do PS, José Rodrigues, votar, por vezes, ao lado dos edis eleitos por um movimento independente, na sequência de divergências entre a autarca e o camarada.
in Campeão de Provincias 08.09.2016

Metro: Movimento cívico convoca reunião para 12 de Setembro

O Movimento Cívico de Coimbra, Lousã, Miranda do Corvo, Góis e Poiares convidou, hoje, os cidadãos dos cinco concelhos a reunirem-se, em Miranda, a 12 de Setembro, pelas 21h00, para reivindicarem o reatamento das obras do Sistema de Mobilidade do Mondego.
“O assunto Ramal / Metro não pode continuar esquecido”, alega Jaime Ramos, porta-voz do organismo.

Segundo o ex-governador civil de Coimbra, “foi um Executivo do PS que destruiu o Ramal, tem de ser o XXI Governo a resolver o impasse, que causa sérios prejuízos à região e às pessoas utilizadoras ou potenciais utilizadores”.

in Campeão de Provincias 05.09.2016

terça-feira, 6 de setembro de 2016

PARQUE PATRIMONIAL DO VALE DO CEIRA – UMA PROPOSTA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

Luiz Alves
Paulo Carvalho

Resumo: 
Na sequência do trabalho desenvolvido pela Lousitânea (Liga de Amigos da Serra da Lousã), o qual permitiu a criação de um cadastro de todas as estruturas edificadas no contexto geográfico (margens) dos municípios do setor superior do Vale do Ceira, apresenta-se uma proposta de intervenção territorial, através da figura de Parque Patrimonial, com vista a salvaguardar e valorizar os patrimónios mais relevantes e contribuir para o desenvolvimento desta sub-região montanhosa do Centro de Portugal.


Palavras-chave: Parque Patrimonial. Desenvolvimento Territorial. Vale do Ceira.

  • Introdução
Os relatórios de “Levantamento da Ocupação Humana nas Margens do Rio Ceira”, nos concelhos de Arganil, Góis e Pampilhosa da Serra (um por cada município), elaborados pela Lousitânea (Liga de Amigos da Serra da Lousã), com base em observação direta (trabalho de campo), permitiram identificar vários períodos históricos, tipologias de construção (de acordo com o seu uso/função) e respetivas variações geográficas, assim como materializaram o ponto de partida para o (re)conhecimento e a posterior salvaguarda e valorização do universo  patrimonial (natural e cultural) do Vale do Ceira, com o intuito de induzir dinâmicas de desenvolvimento para o território.
Na sequência de várias reuniões realizadas com os referidos municípios foi possível preparar um pré-projecto conducente à apresentação de uma proposta de trabalho para a definição e implementação de um Parque Patrimonial no Vale do Ceira, alicerçada numa lógica sustentável e de valorização dos seus recursos, pessoas e lugares.
A proposta inicial, ao invés de assentar em diversas modalidades de investimento, de acordo com a sua maior ou menor complexidade e dimensão, enfatizou um caminho de maior sustentabilidade e responsabilidade económica, social e ambiental, com a apresentação de um projeto estruturado por etapas/objetivos, que poderá ser modelado em função da procura, das necessidades específicas dos lugares e da avaliação corrente das metas que se pretendam alcançar, entre outros fatores.
Neste quadro, a Lousitânea pretende criar um projeto de dinamização e valorização do território mais coeso, integrador e capaz de dar resposta às necessidades dos visitantes (excursionistas/turistas), em simultâneo com uma maior capacidade de envolvimento das populações e atores locais, numa ótica de desenvolvimento sustentável, sem nunca esquecer o principal objetivo da criação do Parque Patrimonial do Vale do Ceira: revitalizar o território, divulgar e valorizar o seu património e promover o aumento da qualidade de vida das populações locais.
  • Desenvolvimento territorial e valorização do património
As atuais dinâmicas económicas, sociais e territoriais, assim como a renovação da imagem das áreas de montanha, refletem a importância estratégica dos recursos ecológicos e culturais, e a sua crescente vinculação ao lazer e turismo, nomeadamente os segmentos relativos aos passeios pedestres, BTT, touring cultural e paisagístico, observação e interpretação da natureza, experiências simbólicas, experiências criativas, aprendizagem/valorização de dimensões culturais materiais e imateriais, entre outros, que podem suscitar trajetórias inovadoras e sustentadas de desenvolvimento regional e local (Alves e Carvalho, 2014).
A evolução das sociedades e do sistema económico, assim como os modos de planear e ocupar o espaço (pós-produtivista e multifuncional) têm conduzido a uma nova ótica e a novos interesses em torno da estrutura e dinâmica dos territórios rurais (Pla e García, 2009).
No caso concreto dos territórios que congregam um forte potencial patrimonial e cultural associado a um enquadramento natural e paisagístico de valor relevante, a sua integração em ações conjuntas, a valorização e promoção de dinâmicas indutoras de desenvolvimento de escala supramunicipal, e uma estratégia coesa de cooperação intermunicipal apresentam-se como referências importantes na dinamização e desenvolvimento dos territórios, com especial destaque para os de matriz rural e de montanha.
Como fazem notar Aguilar, García e Serrano (2013:8), “o desenvolvimento económico regional conta nos últimos anos com instrumentos estratégicos fundamentais, como são os conceitos de paisagem cultural e parque patrimonial, que constituem uma forma sustentável de englobar a conservação e o desenvolvimento territorial”.

No mesmo sentido, a relevância do património (natural e cultural) no seio do desenvolvimento dos territórios, tem sido uma aposta emergente em diversos contextos geográficos à escala mundial. Com efeito, “a gestão inteligente do património tem-se assumido, em vários lugares, como um dos fatores-chave para o seu desenvolvimento económico, porque atrai turismo e investimentos, porque gera actividades e postos de trabalho e, fundamentalmente, porque reforça a auto-estima da comunidade” (Sabaté e Lista, 2001, citados por Bustamante e Ponce, 2004:11). 

A mesma linha de pensamento é apresentada por Pla e García (2009:1), ao considerar que “os bens naturais, culturais e os paisagísticos, desempenham uma função social, uma vez que ajudam a população a reconhecer neles os seus traços de identidade, e servem como factor de desenvolvimento da comunidade a que pertencem. As paisagens e os seus componentes estruturantes funcionam como realidades qualificadoras do ambiente cultural e territorial, e como um factor dinamizador da economia, muito interessante para o desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida em territórios rurais. Uma das estratégias implementadas para o desenvolvimento local em meio rural está relacionada com a aposta no valor da paisagem e do património, através do turismo cultural”. Neste sentido, os segmentos do turismo cultural e de natureza podem criar receita, além de propiciarem o desenvolvimento do conhecimento sobre os aspectos culturais, as tradições e os modos de vida das populações.

Por estes e por outros motivos, torna-se imperativo experimentar, de forma planeada e estruturada, novas formas de valorizar a paisagem e o património cultural dos territórios rurais, com um objetivo múltiplo de ativar o tecido económico e social através da criação de emprego, e de fomento de novos modos de relação e interação entre os agentes locais. 

Ainda que, no presente, a generalidade dos territórios rurais corresponda a conceções e práticas multifuncionais, a sua estrutura e imagem ainda conserva a influência de um passado agro-silvo-pastoril, por vezes marcado por pequenos núcleos de povoamento dispersos, em que a arquitetura (na amplitude das habitações aos muros de delimitação e/ou suporte de leiras de cultivo ou floresta) está integrada na paisagem.
Ao invés de se compreender a sua configuração e dinâmica socioeconómica como debilidades imutáveis e impeditivas de uma regeneração do tecido social e económico, a percepção e valorização dos seus recursos deve ser considerada como prioritária, de forma a transformá-los em oportunidades, tanto para os que neles habitam como para os que os visitam, numa ótica de desenvolvimento sustentável. Com efeito, o meio rural dispõe de elementos e estruturas diversas: artefactos, edifícios, infraestruturas, conhecimentos, técnicas, histórias, tradições, entre outras; que são importantes na ligação entre os territórios e as sociedades que os ocupam (Pla e García, 2009).
            “As áreas patrimoniais procuram contar a história das pessoas ao longo do tempo e como a paisagem deu forma às tradições dos habitantes” (Vincent e Whiteman, 2008, citados por Alonso, 2014:225). “Assim, é normal organizar o território a partir das paisagens culturais ou itinerários culturais organizados em torno de algum tema central, como o passado industrial, episódios bélicos, áreas arqueológicas ou similares” (Clavel-Lévèque, Doukellis e Tirologos, 2002, citados por Alonso, 2014:226). 

            A paisagem cultural no contexto rural resulta de um processo complexo, fruto da adaptação das populações ao meio, procurando moldar e criar um território cada vez menos inóspito, mais favorável à ocupação humana e à realização das suas necessidades (sociais, económicas e culturais) tornando-o, em simultâneo, num território cada vez menos natural, fruto das sucessivas transformações antrópicas destinadas ao seu domínio e controlo. 

Definida por Saeur (1925), a “paisagem cultural é criada por um grupo cultural a partir de uma paisagem natural. A cultura é o agente, a área natural é o meio, a paisagem é o resultado”. Deste modo Saeur vincula definitivamente a paisagem à acção humana, podendo entender-se a paisagem cultural como o registo desta acção sobre o território natural” (Martins e Costa, 2009:57).

Quando há aplicação do conhecimento e tecnologia sobre o território, o Homem transforma-o numa paisagem cultural que, nas palavras de Sabaté (2005), corresponde ao “melhor registo do Homem no espaço”. Assim, a paisagem define-se como “um texto que se pode escrever e interpretar, entendendo o território como uma construção humana. Neste contexto, as paisagens culturais são as paisagens do Homem, criadas por este e interpretadas por ele mesmo” (Pla e García, 2009:3).     
Deste modo, consideramos que as paisagens rurais estão polvilhadas de manifestações culturais. De facto, “se entendermos por património as expressões da cultura e os modos de vida de um grupo social numa área concreta, o meio rural destaca-se tanto pelo seu número como pela sua variedade. Ainda que pela forte presença de elementos da estrutura geoecológica possa parecer o contrário, é por excelência uma paisagem cultural. Apesar dos problemas socioeconómicos (despovoamento e desemprego) que o meio rural apresenta, noutros tempos, quando as actividades agropecuárias ocupavam a maior parte da população e boas extensões de terra, foram espaços dinâmicos” (Pla e García, 2009:3).

3. Parque patrimonial: um instrumento de valorização e revitalização territorial 
3.1 Génese e significado dos parques patrimoniais

A figura de parque patrimonial, embora pouco difundida e aplicada em Portugal, surge, quase em simultâneo, na Europa, com a recuperação da cidade da indústria do algodão de New Lanark (Reino Unido)e nos Estados Unidos América, com a criação do Parque Nacional do Carvão, ambos datados de 1972. Porém, foi sobretudo com a renovação da Company Town of Lowell (Estados Unidos da América) desde 1975 (Barclay, 1979; Hayward, 1987) e no Estado de Nova Iorque desde 1979 (Frenchman e Lane, 1979), “que a recuperação das designadas “áreas patrimoniais”(assim declaradas pelo Congresso Americano) ganham expressão graças às políticas oficiais da administração e à entrada em vigor de legislação protectora” (Martins e Costa, 2009:55), enraizadas desde então nas práticas de planeamento regional nos Estados Unidos da América, com grande sucesso. 
Concomitantemente, na Europa, nos anos setenta (século XX) assiste-se a um crescente interesse na recuperação e patrimonialização “de estruturas físicas abandonadas ou em decadência ligadas a actividades laborais. Foram os casos da pesca na Escandinávia, ou das minas em França, tomando-se em ambos a designação de ecomuseus” (Martins e Costa, 2009:55).
No resto do mundo, a sua difusão tem sido crescente. Por exemplo, na Ásia existe uma maior preocupação com a proteção das paisagens culturais, mais do que com a sua gestão, devido ao enorme desenvolvimento industrial que tem registado. Na América Latina a situação é muito semelhante, embora exista uma maior preocupação e consciencialização a propósito da proteção e gestão das paisagens culturais (Alonso, 2014).
Este novo conceito, assente nos pressupostos da nova museologia (UNESCO, 1973), segundo as palavras de Martins e Costa (2009:55) “supera o de espaço expositivo de tradição neo-clássica e traduz a ideia de um museu voltado para a comunidade. Em harmonia com os ecossistemas naturais e humanos em que se insere, o ecomuseu pode desdobrar-se em vários pólos, espalhados pelo próprio cenário histórico, cenário que se pretende musealizar de modo interactivo”, com valores muito próximos (ou até mesmo iguais) aos que adquirem os parques patrimoniais, evidenciando pressupostos como os “de revalorização e revitalização de paisagens culturais, urbanas ou rurais; o de repensar o território tomando como eixo do projecto os recursos patrimoniais” (Martins e Costa, 2009).
Os parques patrimoniais apresentam-se como “iniciativas heterogéneas que colocam o património cultural no centro das políticas de ordenamento do território e de desenvolvimento económico, procurando a reinvenção de territórios e a participação das comunidades locais no processo de planeamento” (Alonso, 2014:217). A sua relevância deriva da sua potencial influência na configuração macroterritorial das regiões e nos processos de desenvolvimento dos territórios.
Trata-se de um parque vivo, dinâmico, habitado, onde a vida diária é parte do mesmo e o património é o recurso básico em torno do qual gira o parque, de modo que se diferencia, claramente, de outros tipos de parques, como os temáticos ou os ambientais. A sua singularidade baseia-se na imagem que transmite e nas paisagens culturais que o determinam (Bustamante e Ponce, 2004).
Neste sentido, “os parques patrimoniais são ambientes humanizados onde se desenvolve a vida normal dos seus habitantes” (Alonso, 2014:206). Porém, em simultâneo, tentam configurar-se como polos de atração para um tipo de turismo fundamentalmente cultural e ecológico de qualidade.
Estas iniciativas decorrem de um objetivo prioritário, como é a integração, num quadro de respeito pelo território e pelas suas condicionantes, a conivência dos recursos patrimoniais com a educação, a atividade turística e o desenvolvimento sustentável (Martins e Costa, 2010).

Este tipo de parque oferece aos potenciais turistas uma combinação de práticas culturais e naturais que, num contexto de desenvolvimento endógeno, reforçam a identidade da população local, nos domínios cultural, económico e territorial (Sabaté, 2005).
Em termos gerais, o conceito de parque patrimonial implica a noção de projeto e, como tal, compreende a construção de uma imagem que contribua para reforçar a identidade de um território e conceda elementos que apoiem no seu desenvolvimento económico.
Como afirmam Martins e Costa (2010:56), “este modelo apresenta-se como um conceito inovador de preservação cultural, ao incorporar-lhe uma componente propositiva, tomando os valores patrimoniais como activos a partir dos quais se podem vir a obter benefícios económicos”.

Neste sentido, quando se reconhece à paisagem e ao seu património qualidade e potencialidade para ser entendido como um recurso capaz de induzir dinâmicas de desenvolvimento territorial, dá-se início a um processo de reflexão em torno da sua conservação, mas também da sua valorização e promoção. Uma das formas de alcançar este intento é constituída pela aplicação do instrumento referente ao parque patrimonial, embora este não seja reconhecido como um estatuto de proteção legal.
Não sendo um instrumento jurídico, o parque patrimonial assume-se como uma ferramenta técnica que pode ser convertível num projeto de revitalização social, económica, cultural e ambiental. 

Em função do seu contexto territorial e dos componentes que o constituem, podemos considerar vários tipos de parques patrimoniais: industriais; militares; arqueológicos, infra-estruturas históricas de transporte: canais e vias fluviais, parques fluviais e corredores fluviais; parques agrários ou áreas agrícolas patrimoniais; entre outros. 
No seio das iniciativas estudadas por Bustamante e Ponce (2004), foi possível estabelecer algumas características do que se pode entender por parque patrimonial, designadamente as seguintes premissas: 
1. São lugares ou territórios onde se privilegia o desenvolvimento através do uso dos recursos culturais e naturais em equilíbrio (de forma sustentável).
2. Em segundo lugar, são ambientes humanizados e vivos, onde se conjuga a recreação com o viver.
3. Em terceiro lugar, não é nem um parque natural nem um parque temático. Oferece um tipo de serviço intimamente ligado com a identidade de um território.
4. É um espaço onde o património e outros recursos culturais e paisagísticos se combinam para configurar uma paisagem que retrata a história do território e da sua população.
5. Por fim, um parque patrimonial representa um espaço onde os recursos patrimoniais são o elemento chave no desenvolvimento económico do território.
Em suma, um parque patrimonial é uma ferramenta que nos exorta a contemplar o património como um recurso útil, capaz de gerar um sentimento de pertença territorial e de impulsionar socioeconomicamente um território. O parque converte-se num símbolo e num ponto de referência para a população local, mas também para os visitantes. Assim, pretende assumir-se como uma peça fundamental nas estratégias de desenvolvimento territorial (Bustamante e Ponce, 2004). 
Neste sentido, “ao conjugarem valores naturais e artificiais, ao resgatarem espaços tradicionais e antigas actividades, ao reencontrarem o ancestral equilíbrio entre homem e natureza, os parques patrimoniais assumem o repto lançado por proeminentes precursores da ecologia da paisagem: o de tornar as estruturas construídas em elementos de valorização e continuação dos processos naturais” (Martins e Costa, 2010:57).

Os parques patrimoniais supõem um estímulo de primeira ordem para o desenvolvimento sustentável, porque conseguem combinar conservação e desenvolvimento, economia e ambiente.    
            Seguindo o pensamento de Aguilar, García e Serrano (2013:8), “a maior parte das propostas para a concepção de um parque patrimonial, contém inúmeras semelhanças e todas elas são equiparáveis aos componentes evidenciados por Lynch (1984), a saber:
            ‒ O âmbito global e subdomínios do parque - Áreas (regions)
            ‒ Os recursos patrimoniais e os serviços - Marcos (landmarks)
            ‒ As portas e acessos, os centros de interpretação e museus - Nós (nodes)
            ‒ Os caminhos que ligam o interior do parque - Itinerários (paths)
            ‒ Os limites visuais da intervenção - Fronteiras (edges)
            É necessário partir de uma base sólida relativamente aos princípios que norteiam a implementação de qualquer iniciativa deste tipo, por isso, compreendemos o valor da paisagem, em sintonia com os três pilares que consubstanciam o desenvolvimento sustentável, como um marco referencial que engloba a temática da proteção patrimonial (Allende, 2002). Nesse sentido falamos da paisagem cultural como:
            ‒ Património cultural e histórico;
            ‒ Indicador de qualidade ambiental;
            ‒ Recurso económico que atrai investimento e atividade turística”.
Por conseguinte importa que os parques patrimoniais alicercem toda a sua estratégia na valorização dos recursos endógenos e no envolvimento dos stakeholders. Portanto, “os parques patrimoniais mais bem sucedidos são marcados por processos bottom-up, contando desde o início com a participação dos chamados grassroots, os amantes do território que se resistem a abandoná-lo e que se interessam, com espírito de militância, pelo seu futuro” (Martins e Costa, 2010:56).

3.2 Parques patrimoniais em Portugal

No panorama nacional, os parques patrimoniais apresentam, até ao momento, uma expressão residual, quase nula. Pese embora Portugal tenha três paisagens culturais inscritas na lista de Património Mundial da Humanidade da UNESCO (Sintra, Pico/Açores e Alto Douro Vinhateiro), nenhuma delas está a ser gerida com recurso a um instrumento integrado e operativo, como seria o caso de um parque patrimonial (Martins e Costa, 2010).
Apesar da inexistência de experiências consolidadas de parques patrimoniais em Portugal, apresentam-se três propostas, com processos situados em vários estágios de maturação: duas em fase de implementação/proposta, e outra em fase de projeto já com atividade no terreno.
No caso do parque com atividade, referimo-nos ao Parque Mineiro da Cova dos Mouros, localizado em Vaqueiros, no Algarve, que surgiu de uma velha mina de cobre e ouro. Proporciona um circuito pedestre em redor das antigas minas, além de reconstituições históricas, desde há 5 mil anos até ao início do século XIX. Neste passeio, o visitante, pode ainda conhecer uma aldeia primitiva e um forte, datados de 2500 a.C..
No caso dos parques patrimoniais em fase de projeto/proposta, importa referir o que tem tido uma maior divulgação e impacto mediático nos últimos anos, na Região Centro: o Parque Patrimonial do Mondego. Embora, na atualidade, não seja possível identificar e explicitar o estado geral do projeto, que parece ter entrado no período de “estagnação”, tendo em consideração a inexistência de notícias alusivas ao projeto na imprensa regional, e a inoperacionalidade da sua página na internet. Este surge em 2007, na sequência de vários seminários de formação realizados em Coimbra. Envolvendo várias entidades, o projeto do Parque Patrimonial do Mondego visa a revitalização e valorização da paisagem cultural das margens do rio Mondego entre o Porto da Raiva, no concelho de Penacova, e a foz, na Figueira da Foz, procurando ajudar a combater o declínio socioeconómico das populações ribeirinhas e a degradação da paisagem cultural do Mondego.
Assumindo-se como um projeto e modelo de gestão do território que tem no rio Mondego o seu eixo temático principal, “o Parque Patrimonial do Mondego apresentou, como principais objetivos:
‒ Revalorização e revitalização da paisagem ribeirinha do Mondego num quadro de sustentabilidade ambiental, social e económica, contribuindo assim para atrair investidores e turistas e, sobretudo, para reforçar a auto-estima das populações;
‒ Promover o estudo e o debate sobre as paisagens culturais, focando, em particular, a do rio Mondego, e fazê-lo conjugando a voz popular com a do meio universitário;
‒ Tornar-se numa infra-estrutura de ócio e cultura dinâmica e flexível, apoiada numa visão pró-activa, reflexiva e criativa do património e da história local e adaptável aos interesses dos visitantes” (Martins, 2011:61). 
Em dezembro de 2007 foi um dos dez projetos selecionados para o concurso mundial de Turismo Sustentável na “Tourism Summit”, que teve lugar em Chamonix-Mont Blanc. Em 2008 foi apresentado no concurso “Mentes Brilhantes, Ideias em Turismo” organizado pela Universidade de Aveiro-GrupUnave, tendo recebido o 3º prémio.

            No segundo caso, mais recente (com apresentação em fevereiro de 2014), as Câmaras Municipais do Sabugal e de Penamacor pretendem criar o primeiro parque europeu de turismo sustentável transfronteiriço do património ‒ o Linx Park (Lince Parque). Segundo as informações disponibilizadas pelos autarcas à imprensa, o projeto deverá ser candidatado aos fundos do quadro comunitário 2014-2020 e já se encontra em fase de adjudicação de estudo, com o intuito de delinear qual a melhor forma para avançar com o Linx Park, o que, à partida, deverá ser feito em conjunto com as localidades vizinhas de Espanha.
Pretende preservar e valorizar um conjunto de património natural, cultural e paisagístico que é relevante para o desenvolvimento da região. O objetivo é que tal permita um maior aproveitamento do território, designadamente em termos desportivos e turísticos, em articulação com a salvaguarda da natureza.

4Parque Patrimonial do Vale do Ceira 
O território rural é uma figura heterogénea fundamentada numa série de fatores e elementos singulares destacando-se, entre outros, os núcleos populacionais, os terrenos de uso agrícola ou a arquitetura tradicional. São caraterísticas que, pela sua especificidade, se convertem em recursos que dotam o território de pontos fortes que se podem integrar em estratégias de desenvolvimento e oportunidades de futuro para a população local.
O projeto do Parque Patrimonial do Vale do Ceira(figura 1) assenta numa visão contemporânea do conceito de património, o que pressupõe, desde logo, assumir o envolvimento das populações e organismos locais e a adopção do conceito de paisagem cultural, aquela que é gerada pelo binómio natureza-cultura, ou seja, “o registo da acção humana sobre o território” (Sauer, 1925, citado por Martins, 2011).
De forma simplificada, tanto sob o ponto de vista fisiográfico (geomorfologia, biogeografia e hidrologia) como no que concerne à utilização/ocupação do território, podemos considerar que o rio Ceira (figura 2) apresenta duas unidades paisagísticas principais, a saber:
‒ Alto Ceira, desde a nascente até perto da vila de Góis;
‒ Baixo Ceira, a partir da vila de Góis e até à foz (na proximidade da cidade de Coimbra). 
Porém, uma análise mais aprofundada à paisagem será fundamental para uma caracterização mais completa deste afluente do Mondego, designadamente a sua desagregação em sub-unidades, destrinçadas pelo grau de homogeneidade interna que possam evidenciar e a sua distinção das demais. 
No Alto Ceira, as paisagens revelam em maior amplitude as marcas das influências geofísicas, com relevos acidentados, elevações consideráveis e declives acentuados, que se traduzem num Ceira serrano (ou de montanha), de formações xistosas, apenas rasgadas por cristas quartzíticas, com predomínio de culturas de cereais pobres, como o centeio, embora com grande peso na cultura do milho até tempos pouco recuados, e atividades como a pastorícia (que já teve maior relevância na economia local) e a silvicultura, entre outras.
A jusante da vila de Góis, podemos já considerar um Ceira de várzeas (apenas pontualmente assume uma configuração de vale apertado e traçado sinuoso, como acontece em particular no troço Segade-Cabouco), com solos mais ricos em aluviões e de maior amplitude (dimensão), o que explica o predomínio de outras atividades, quer no passado, quer no presente, com destaque para os viveiristas. 

Por outras palavras, o rio Ceira, cuja nascente está localizada nas cumeadas da Serra do Açor (sensivelmente a meio do bloco noroeste da cordilheira central), percorre serras de xisto e alguns relevos quartzíticos, antes de entrar na bacia sedimentar de Lousã- Arganil; em seguida, em jeito de derradeira etapa do seu percurso, atravessa o rebordo montanhoso do maciço antigo, e segue caminho para entregar as suas águas ao Mondego, às portas de Coimbra.

As dinâmicas naturais e antrópicas no vale do Ceira ao longo das últimas décadas, designadamente o desaparecimento e a degradação de partes significativas do património construído nas margens do rio, a alteração e a degradação do revestimento florístico, o declínio demográfico, a deficitária base económica em grande parte das aldeias mais distantes das sedes de concelho, a par do crescente envelhecimento populacional e do aumento do risco de perda de alguns dos saberes ancestrais, entre outras, são sinais de preocupação e o ponto de partida para que possamos enveredar esforços com vista a estruturar uma proposta capaz de assumir-se como uma mais-valia para induzir dinâmicas positivas de desenvolvimento nesta região. Ao mesmo tempo, para além dos desafios evidenciados, são reconhecidos ao vale do Ceira oportunidades de desenvolvimento, através da promoção dos seus recursos e produtos, em estreita relação com a valorização da sua paisagem cultural que, a par de vários elementos diferenciadores, poderão ser fatores importantes para a sua revitalização.

Ao vale do Ceira será fundamental lançar um projeto que alie conservação e salvaguarda do património cultural e natural à sua valorização e divulgação, com o propósito de gerar mais-valias económicas para o território, por via de uma relação que se pretende biunívoca. De facto, a existência de uma série de recursos patrimoniais e a sua disponibilidade justificam a criação e implementação deste projeto como uma estratégia de desenvolvimento que promova a revitalização económica e social da região.

Deste modo, acreditamos que o vale do Ceira apresenta condições excecionais para oferecer atividades de lazer e turismo atraentes, que enriquece a cultura, valoriza a identidade local e promove o desenvolvimento económico. Porém, neste caso, não falamos de um qualquer segmento de turismo. Ao invés propomos a fundamentação do seu desenvolvimento numa base estruturada em torno dos segmentos do turismo cultural e de natureza. Neste contexto convém vincar que estes segmentos são muito menos afetados pelo fenómeno da sazonalidade do que, por exemplo, o turismo balnear, apresentando uma distribuição mais equilibrada de entradas de turistas ao longo do ano. Por outro lado, em termos médios, o seu gasto é superior, apresentam boas práticas de fruição e de respeito pelo património, valorizam os produtos locais de qualidade e a genuinidade cultural, a par da interação com a população local e os seus saberes.

Para além disso, de uma forma geral, constituem modalidades turísticas que requerem menos urbanização, menos edificação e menos infraestruturas viárias, logo, pressupõem menores impactos ambientais adversos e menor esforço de investimento. Podemos assim afirmar que os parques patrimoniais enquadram-se, de modo indireto, nas preocupações do turismo sustentável.

Para a realização do projeto, existe um vasto número de necessidades a realizar, entender, ponderar e estudar. O projeto deve estar assente em vários objetivos parciais, como a identificação e descrição de paisagens e recursos patrimoniais existentes ao longo das margens do rio. Este objetivo é complementado com a análise das informações necessárias para fundamentar a proposta de criação do parque patrimonial.
Uma vez analisados ​​e cartografados os recursos singulares do território, são ponderados os valores mais significativos que acreditamos justificar a proposta, incluindo neles: valores paisagísticos e culturais; valores estéticos; valores económicos.
Neste contexto, torna-se imperativo fundamentar a lógica a gerar pelo projecto, de forma ponderada e participada entre os vários agentes locais, para que se possam definir os principais elementos do projecto, na sua fase inicial, de arranque, como sejam:
  • Definição de área e subáreas do parque;
  • Inventariação, sinalização e hierarquização de pontos marcantes/recursos patrimoniais;
  • Localização de nós: centros de interpretação, portas de entrada e interfaces modais;
  • Desenho de um sistema integrado de roteiros pedagógicos, lúdicos e turísticos, com base nos pontos sinalizados.
Por fim, o pré-projeto apresentado define, numa primeira fase, os principais objetivos ao qual o Parque Patrimonial deve dar resposta, que incidam, prioritariamente, na valorização territorial como forma de aumentar a qualidade de vida das populações locais e a sua revitalização económica e social, a saber:
  • Revalorização e revitalização da paisagem do vale do rio Ceira num quadro de sustentabilidade ambiental, social e económica, contribuindo assim para atrair investidores e turistas e, sobretudo, para reforçar a auto-estima das populações;
  • Tornar-se numa infraestrutura de ócio e cultura dinâmica e flexível, apoiada numa visão próativa, reflexiva e criativa do património e da história local e adaptável aos interesses dos visitantes, tendo por base os segmentos do turismo cultural e de natureza.
Por outro lado, torna-se imperativo proceder à identificação das linhas estratégicas ou ações prioritárias no quadro de atuação do Parque Patrimonial do Vale do Ceira, podendo ser consideradas as seguintes:
    •  Utilizar o instrumento de abordagem territorial que tem produzido efeitos bastante positivos em vários exemplos por todo o mundo, com a criação do parque patrimonial, num contexto de desenvolvimento territorial de escala regional e de cooperação intermunicipal;
    • Projetar os roteiros como expressão física de ideias culturais e ambientais, conferindo-lhes um desenho ambivalente, e dotando-os de diferentes meios de locomoção em função do que mais se aproxime do momento histórico original;
    • Recorrer às tecnologias da informação e da comunicação, colocando-as ao serviço da recolha de dados, da georreferenciação, da gestão territorial, da informação turística e do interface com os visitantes;
    • Estabelecer parcerias com instituições de Ensino Superior tendo em vista `a organização de workshops, de seminários e estágios que visem o estudo mais aprofundado dos vários elementos da paisagem do vale do Ceira, nas vertentes cultural (material e imaterial) e natural;
    • Produzir recolhas documentais e orais sobre as tradições do vale do Ceira,
    • Desenvolver um fórum de discussão junto dos atores e das populações locais;
    • Implementar a educação ambiental e patrimonial no contexto dos residentes, dotando-os de ferramentas essenciais para o contacto com turistas e outros visitantes;
    • Promover o envolvimento do tecido empresarial da Região e da diáspora da Beira Serra.
5. Notas finais
O resultado dos levantamentos efetuados nas margens do rio Ceira nos municípios de Arganil, Góis e Pampilhosa da Serra, constituiu o ponto de partida para delinear uma estratégia que possa contribuir para atenuar/contrariar o declínio socioeconómico das populações deste território e a degradação da paisagem cultural do Ceira, através da criação e dinamização do projeto do Parque Patrimonial do Vale do Ceira (PPVC).
            Assim, apresenta-se como imperativo compreender que a paisagem humanizada do rio Ceira e o seu património material e imaterial, podem ser elementos fundamentais na revalorização territorial, com base na criação de um instrumento de desenvolvimento sustentável, e mediante o planeamento estratégico da estruturação da oferta turística e de lazer. Porém, o trabalho de base deve partir sempre da hipótese de análise do rio Ceira como matriz geográfica e cultural, ou seja, como um “núcleo genético” que explique e sintetize a identidade do território.


Governo requalifica Vale do Ceira, interior do distrito de Coimbra

Góis, Coimbra, 02 set (Lusa) - O secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, disse hoje que a tutela está a desenvolver um projeto para o Vale do Ceira, no interior do distrito de Coimbra, apoiado por um fundo norueguês com dois milhões de euros.

"Não são dois milhões para gastar em obras, que só por si não garantem sustentabilidade. É para ser um projeto em rede, que possa trazer valor acrescentado e, sobretudo, um projeto sustentável no tempo", disse o governante, na Cabreira, concelho de Góis, de onde é natural.

Segundo Carlos Martins, que participava na apresentação do Parque Patrimonial do Vale do Ceira, desenvolvido pela Lousitânea - Liga de Amigos da Serra da Lousã, com a participação dos municípios de Góis, Arganil e Pampilhosa da Serra, o projeto deve iniciar-se em 2017 e desenvolver-se entre dois a três anos.

A intervenção no Vale do Ceira, que poderá vir a acolher propostas do projeto do Parque Patrimonial, passa pela dimensão hidráulica, turística, "que pode ter obras ou não, de relação com as populações, com o uso e a qualidade da água, a defesa de algumas infraestruturas e a criação de alguma riqueza".

"Não esperamos criar condições para um grande crescimento, mas queremos criar condições para que haja desenvolvimento e as pessoas que aqui estão tenham riqueza e vivam bem com aquilo que são os seus recursos locais e regionais", sublinha Carlos Martins.

O secretário de Estado do Ambiente considera que, se o projeto tiver sucesso, poderá ser complementado com outras candidaturas ao mesmo fundo, "que destina estes dois milhões numa primeira fase".

No sentido de o projeto ser "verdadeiramente integrado", o governante salientou que depois é preciso também "encontrar outras valências e outros fundos no turismo, no ministério da Administração Interna e da Agricultura, porque é assim que as autoridades que vão financiar entendem que o dinheiro é bem aplicado: quando acrescenta valor e é feito em rede com os cidadãos e com as instituições sejam públicas ou privadas".

Sobre o projeto do Parque Patrimonial do Vale do Ceira, que pretende valorizar o território de seis freguesias dos concelhos de Góis, Arganil e Pampilhosa da Serra, ao nível natural, turístico e cultural, Carlos Martins disse que tem "todos os ingredientes para ser um caso de sucesso".
AMV // SSS
Lusa/fim

in Porto Canal, 2.09.2016